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A vida vale muito a pena, por uma série de coisas...
Goiânia, Goiás, Brazil
Psicóloga Clínica, formada pela PUC - Goiás. Formação em psicanálise pelo Instituto Sedes Sapientiae de São Paulo e Clínica Dimensão de Goiânia. Psicóloga - Comissão Executiva de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas do Estado de Goiás - Secretaria de Estado de Políticas para Mulheres e Promoção da Igualdade Racial.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Afetos encapsulados - Iza Junqueira

Esses dias, ouvi falar da peça: Máquina de abraçar, cuja narrativa percorre o universo autista, ainda tão incompreendido, tão difícil de penetrar, um dialeto tão confuso, um olhar distante, desprendido. O não - desejo de ser tocado, ser olhado, é um pouco o que o autista mostra de si.

Há dias venho pensando em colocar algum texto no blog sobre pessoas que sentem muita dificuldade em falar de si, de demonstrar qualquer tipo de afeto, seja ele qual for, ou mesmo desafetos. Sabe quando você cumprimenta uma pessoa com um aperto de mão e sente uma superficialidade no toque, não há uma firmeza no gesto, não há correspondência afetiva, é uma mão que não suporta o toque. Isso se estendendo ao olhar, porque além das mãos, do toque, o olhar inicia um discurso, ele te dá dicas de: para que olho eu estou olhando, que olhar é esse? Isso quando a pessoa permite esse contato. E assim o nosso corpo todo vai falando, vai ficando nu, mesmo com tantas barreiras, tantas defesas.

Essa leitura simbólica: facial, dos gestos, da sonoridade de cada pessoa, daquelas que conversam tão baixinho, para que não possam ser ouvidas, ou das que já querem ser ouvidas de qualquer jeito, tudo isso enriquece muito toda essa travessia nossa por essa vida. Estar atento ao nosso corpo, a nossa voz, aos nossos desejos, enfim, é um grande exercício e precioso também, mas que às vezes a gente faz “pouco caso”, não dá ouvido, àquilo que tanto quer falar. E fala, mesmo sem a gente perceber, e tem sempre alguém que vai olhar e vai ver.

Existe também uma dificuldade em receber um elogio, tem sempre um: “Que nada, são seus olhos”. Sim, são os seus olhos mesmo, mas são os meus é que não estão querendo ver. Pessoas que passaram por constrangimentos afetivos importantes, sentem muita dificuldade em corresponder a uma simples intenção de carinho, e sofrem muitas vezes com isso. E isso não tem nada a ver com ser muito falante e risonho não, tem pessoas mais quietas, que são extremamente generosas, que te olham de uma forma muito boa, que te conquistam pelo aperto de mão, por uma palavra que chega numa hora especial.

Essas pessoas que conseguiram entrar na esfera afetiva sem tantos conflitos, lidam melhor consigo, com o mundo e com o outro. Claro, nós estamos o tempo todo expostos, sujeitos a sentir medo, vontade de chorar, de ter alguém por perto, de se isolar, de não falar, ou querer falar demais, e é muito bom a gente deixar que os afetos brotem, que a gente possa revelá-los, mesmo que a foto não pareça tão boa assim, mas o ato de revelar, a si, já é uma grande descoberta.

Iza Junqueira

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